Gregório de Matos (1636-1695), poeta contemporâneo de Padre António Vieira, conhecido por boca do inferno pela sua ousadia ao criticar a Igreja Católica, muitas vezes ofendendo padres e freiras.
- Tristes sucessos, casos lastimosos,
- Desgraças nunca vistas, nem faladas.
- São, ó Bahia, vésperas choradas
- De outros que estão por vir estranhos
- Sentimo-nos confusos e teimosos
- Pois não damos remédios as já passadas,
- Nem prevemos tampouco as esperadas
- Como que estamos delas desejosos.
- Levou-me o dinheiro, a má fortuna,
- Ficamos sem tostão, real nem branca,
- macutas, correão, nevelão, molhos:
- Ninguém vê, ninguém fala, nem impugna,
- E é que quem o dinheiro nos arranca,
- Nos arrancam as mãos, a língua, os olhos.
Conselhos a qualquer tolo para parecer fidalgo, rico e discreto
- Bote a sua casaca de veludo,
E seja capitão sequer dois dias,
Converse à porta de Domingos Dias,
Que pega fidalguia mais que tudo.
Seja um magano, um pícaro, um cornudo,
Vá a palácio, e após das cortesias
Perca quanto ganhar nas mercancias,
E em que perca o alheio, esteja mudo.
Sempre se ande na caça e montaria,
Dê nova solução, novo epíteto
E diga-o, sem propósito, à porfia;
Quem em dizendo: "facção, pretexto, efecto".
Será no entendimento da Bahia
Mui fidalgo, mui rico, e mui discreto.
Sem comentários:
Enviar um comentário